Com o humor que lhe é característico, Woody Allen afirmava
que em relação à morte só tinha uma opinião: era contra!
Quer-me parecer que se fosse possível opinar sobre o
inevitável, todos teríamos a mesma opinião. Mas esta é a única questão que não aceita plebiscito nem está a votação. Existe ,
encontra-se no fim da linha de todos e de cada um de nós e pronto!
Tento ter perante este facto incontornável uma atitude o
mais positiva possível, mas nem sempre consigo.
A morte só é aceitável quando natural. Pode ser revoltante
quando acontece demasiado cedo ou quando vem de maneira aparentemente evitável:
um acidente estúpido , uma distracção, um erro de diagnóstico. Mas é aceitável.
Para uns estava escrito num livro algures na biblioteca do além e com o título
de destino. Para outros é uma fatalidade, um mal que não se pôde evitar.
Destas tenho tido , infelizmente, alguns casos próximos.
Duma forma ou outra tento reprimir a revolta que me assola pelo vazio que a
partida dos que amo me deixa.
Mas a que mais me revoltou , a que não aceito , a que me pôs
completamente fora de mim , foi a morte dum quase desconhecido.
Um indigente, sem
abrigo, que fizera duma caixa de
multibanco daquelas fechadas, a sua casa. Todos os dias de manhã enrolava os
seus pertences por detrás da porta e ia à sua vida. Vida sem rumo, mas vida.
Não se metia com ninguém, nem tão pouco era violento ou insultuoso. Débil de
cabeça, quem sabe fruto da bebida e das agruras da vida, lá ia pedindo aqui e
ali um cigarrito, fazendo uns biscates…
No bairro todos o conheciam. Uma senhora mais caridosa,
cuidava-lhe da roupa, autorizava-lhe o balho semanal, dava-lhe de comer e geria-lhe o pouco dinheirito que tinha.
Certo é que o homem , embora com aspecto de sem-abrigo,
tinha um ar minimamente limpo e o lugar onde pernoitava não estava nauseabundo
como acontece por vezes nos lugares mais públicos.
Na noite de S. João no Porto o Valter foi morto!
Agredido a pontapé e a soco, deixado no seu próprio canto, agonizante,
foi descoberto pela primeira pessoa que, ao levantar dinheiro estranhou vê-lo
ainda deitado. Resultado de noite de folia pensou. E foi então que viu o sangue
.
O Valter foi assassinado sem misericórdia e sem sentido.
Gratuitamente, apenas pela diversão duma noite de festa. O Valter não terá
direito a inquérito policial e os seus assassinos ficarão impunes.
Morreu como viveu: um despojo da sociedade, anónimo,
descartável.
Esta é uma morte da qual sou completamente contra! Sobretudo
porque será esquecida!
Também eu sou contra. E contra ninguém se importar.
ResponderEliminarMas falaste e assim Valter não morreu anónimo
(emocionei-me)
bj