segunda-feira, 2 de julho de 2012

PROFESSOR ALBÉRICO








Todos nós tivemos professores que nos marcaram, uns pela positiva outros nem por isso. De vez em quando vêm-nos à memória e os sentimentos que experimentámos ás suas mãos - medo, ternura, felicidade - fazem-nos sorrir.

Hoje o meu sentimento é de vazio pela morte dum homem que, embora não me fosse muito querido ( era professor de Matemática!!) era uma referência no liceu onde andei e na cidade onde vivi.

Chamava-se Albérico e nunca ninguém o tratou por doutor ou Sotôr. Ele era o professor Albérico e com o título ia o respeito de todos os que, directa ou indirectamente, com ele contactavam.

De uma inteligência francamente fora do comum, formou centenas de alunos e conseguiu o milagre de fazer com que alguns deixassem de odiar os números e fossem hoje grandes homens em áreas de engenharia. Não foi o meu caso. Aliás lembro-me do ar dele, bata imaculadamente branca ( sim ele sempre usou bata branca) aberta escorregando dos ombros , dizer-me com ar pesaroso:

- Ai filha tão inteligente para umas coisas e tão burrinha para outras!! Sendo que as outras, está bem de ver, eram as equações e quejandos que não me entravam nem á lei da bala. Não via beleza nenhuma naquilo!!

- A Matemática é a ciência mais bela que existe porque não depende da vontade nem da força dos homens.

Pois sim abelha!

Não obstante sempre gostei dele. A sua figura muito direita, seca de carnes, com a sua boina basca, o seu passo firme e o seu ar austero,o professor Albérico era uma referência em Oliveira de Azeméis.

Por trás daquele ar que intimidava estava porém um homem com um coração doce e terno. Sim sim, bem sei que muitos que me possam ler e que o tenham conhecido dirão que é bondade de obituário. Lamento mas não é. Foi preciso que ele se jubilasse e outros laços se estabelecessem para que eu o conhecer. Marido , pai e avô completamente dedicado, o Professor Albérico era a antítese do homem que em plena sala de aula ameaçava ( sem nunca, mas nunca cumprir nem sequer no tempo da "outra senhora!"):

- Começo a apanhar milho por aqui fora e vai tudo a eito!! - e exemplificava com os dois braços batendo dum lado e doutro.

Exasperava-o a inaptidão para os números. Não a entendia!

- Vocês parecem aquele tipo que começou a arrancar as árvores uma a uma à espera de encontrar a raiz quadrada, caramba!!!

O Professor Albérico morreu. Um acidente estúpido tirou-lhe a vida juntamente com a mulher quando regressavam a casa.

Dele fica, para os que o conheciam., a imagem dum homem íntegro, bata branca escorregando dos ombros magros, boina basca na cabeça onde os números pintavam as mais belas imagens.

Meu querido professor, ainda hoje não sei fazer equações e Pi é apenas um som, mas se falhou na sua missão de fazer de mim amante de números, conseguiu fazer-me amar os homens.

Grata e até sempre!

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